O Diário (nada) Secreto – Capítulo 6

Conheça O Diário (nada) Secreto

Capítulo 1 – Recepção Calorosa

Capítulo 2 – Jogo de Interesses

Capítulo 3 – As sete coisas que não se deve fazer em uma festa

Capítulo 4 – A semana seguinte

Capítulo 5 – Cíúmes

Capítulo 6 – Proibido é Mais Gostoso
– Oi, mãe!
– Oi, filha.
– Como a senhora está?
– Lolita, o que você quer?
Por que toda mãe prevê automaticamente que nós queremos alguma coisa quando somos gentis? Os filhos não têm direito de usar a educação que lhe foi ensinada com suas adoráveis mamães por um mísero segundo sem serem julgados como verdadeiros sanguessugas?
Isso é uma grande injustiça, se vocês querem saber o que eu acho!
– Festa no próximo domingo? – arrisquei, com uma careta. Até fechei os olhos pra não ver a cara dela.
Ah, sim, me lembrei agora por que toda mãe acha isso. Porque, geralmente, elas estão certas.
– Num domingo, Lolita? – a sua voz era tipo “você ficou maluca?” – Você ficou maluca?
O que foi que eu disse?
– Mãe, qual é! – exclamei, fazendo beicinho – Não custa nada! Eu vou com a Sabrina e a Nana e volto com elas.
– Você tem aula na segunda-feira, mocinha, pode esquecer. Eu duvido que a sua tia vá deixar, de qualquer forma.
– Eu duvido que ela não deixe! Mãe, por favor, eu não vou chegar tarde e eu vou pra droga da escola na segunda de manhã, de qualquer jeito!
– Vai, é claro que vai. – deu as costas e começou a andar em direção ao corredor – Principalmente porque você não vai a lugar nenhum no domingo!
Bufei.
Nota: nenhuma mãe se lembra que foi adolescente. Elas adoram agir como se tivessem nascido adultas, e esquecem que uma única festa num domingo não vai destruir as nossas vidas. E que um dia dormindo na aula não vai mudar nada, porque, afinal, é isso o que a gente faz todos os dias mesmo.
Certo, e o que eu ia fazer agora? Sem chance de eu perder uma festa à qual todo mundo ia! Era a oportunidade que eu precisava pra me distrair de todo aquele monte de coisa de ciúmes e vida desmoronando à minha volta. Eu tinha que dar um jeito!
Então, na manhã seguinte, resolvi ter uma consulta básica com as especialistas em convencer mães: Giovanna e Sabrina.
Na verdade, a minha intenção inicial era pedir ajuda pra Belatriz, porque ela é minha melhor amiga e tem obrigação de me escutar e tentar me dar algum apoio. Mas ela estava ocupada demais aproveitando seu tempo com o namorado, e eu não quis interromper; afinal, se ela voltasse ao seu estado natural SEM o Willian, quem ia agüentar seu falatório incansável sobre seus problemas caseiros com a irmã gêmea nada parecida com ela, seria eu.
Então, fui procurar a Sabrina. No entanto, me esqueci que, quando se procura pela Sabrina, a Giovanna é parte do pacote. As duas irmãs super unidas que falam sobre tudo e coisa e tal. Uma ainda estava puta da vida por toda a história com a Lana. A outra tinha aquele sorrisinho prepotente que eu sabia exatamente a quem era destinado. Quase desisti, mas eu já estava enforcada mesmo, certo?
– Eu estou com um problema. – declarei, me sentando com elas. Graças a todos os santos, o Edson não estava lá ainda.
– Bem vinda. – a Sabrina resmungou e eu fiz um muxoxo. A Giovanna riu.
– O que foi? – ela perguntou, e eu me senti grata por pelo menos uma não estar de mau humor. E por ela ser capaz de fingir que não me olha como uma ameaça de vez em quando.
– Preciso de uma dica pra convencer a minha mãe a me deixar ir na festa de domingo. – respondi, e a Nana torceu o nariz.
– Na dos formandos?
– É.                                                                                                      
– Você disse que nós vamos?
– Disse, e não adiantou.
– Já pensou em não pedir?
Foi a minha vez de torcer a cara. Aquilo não ia dar certo nem em um milhão de anos!
– Como, exatamente? – me arrisquei a perguntar – Tipo… mentir?
– Mentir é uma palavra muito forte! – a Giovanna exclamou, com uma cara do tipo “que absurdo!” – Mais como arranjar outro compromisso.
– A minha mãe não vai cair nessa!
– Claro que vai! Você só tem que fazer a coisa do jeito certo.
– E como é o jeito certo?
Caramba, caramba! Aquilo não ia funcionar NUNCA! Ainda mais comigo!
Respirei fundo pra ficar calma antes de entrar na cozinha pra falar com a minha mãe. Era domingo de manhã, e eu tinha passado a semana toda na minha, sem dizer nada. Agora eu estava com o telefone nas mãos, ligado sem ninguém do outro lado da linha, prestes a fazer uma encenação histórica.
Onde eu estava com a minha maldita cabeça pra tentar cometer aquele suicídio monumental?
– Mãe? – chamei, e limpei a garganta. A expectativa de mentir pela primeira vez pra minha mãe estava me deixando nervosa e sem voz.
– Oi, filha. – ela respondeu, de costas pra mim. Estava lavando a louça. Respirei fundo mais uma vez e apertei os dedos em torno do telefone. Minha mão estava suando.
– A Bela quer saber se eu posso ir até lá. – eu disse, mordendo o lábio inferior de tanto medo de que ela ligasse os fatos.
– Você ta falando com ela?
– Eu liguei pra ela.
– Hm… – fez um minuto de silêncio, e então se virou. Eu tentei relaxar a expressão e sorrir, apertando o telefone contra o peito – Você sabe ir até lá sozinha? Eu não posso te levar.
– Sei, sei sim. – respondi, mecanicamente, tentando não sair pulando e comemorando logo de cara.
– Certo, então tudo bem.
Dei um sorrisinho, e coloquei o telefone na orelha. Hora da parte mais teatral de todas.
– Bela? – fiz uma pausa mínima, como se realmente alguém estivesse respondendo – Oi, a minha mãe deixou eu ir! – outra pausa. Minha mãe ainda estava olhando, e eu fui saindo de fininho. Quando achei que tinha dado tempo suficiente, conclui – Então a gente se vê mais tarde. Tchau.
E desliguei o telefone.
Eu merecia o Oscar depois dessa!!!
Ok, então eu ia àquela festa. O que eu iria vestir?
Fui direto pro quarto, tranquei a porta e abri o guarda-roupa. Calças, calças, casacos, calças. Eu era básica demais. Afora o vestido que eu tinha usado na festa da Lana, eu não tinha nada mais curtinho no guarda-roupa – e aquele vestido era social demais pra ocasião! Eu ia pra festa dos formandos acompanhada das duas garotas mais bonitas da escola usando calças?
É o que parece.
Peguei umas calças e revirei a gaveta de blusinhas e fui aos poucos separando umas peças que podiam servir. Depois que filtrei tudo o que eu achei que prestava, abri a porta do armário que tinha o espelho minúsculo e supostamente de corpo inteiro, e comecei a experimentar as roupas.
Só Deus sabe como eu odeio experimentar roupas. Experimentar, comprar, tudo isso me deixa tonta. Eu não nasci pra ser consumista, e definitivamente não tinha sido feita pra ficar horas trocando de roupa pra me olhar num espelho. Como sempre, depois de provar milhões de peças de roupa, todas elas pareciam uma grande porcaria pra mim, mas alguma delas teria que servir! Eu não tinha tempo, nem paciência pra ir arranjar alguma coisa nova.
Bufei, e acabei optando por uma calça jeans um pouco mais escura e uma blusinha de pano fino roxa. Teria que servir. Era só me maquiar, pentear o cabelo, pôr uma sandália no pé e pronto. Não importava quantas roupas eu colocasse, quão perfeita eu ficasse, eu ainda estaria entrando com a Sabrina e a Giovanna, e isso é mais competição que uma única garota pode agüentar.
Por fim, enfiei tudo de que iria precisar numa mochila, tentando ao máximo não amassar nada, e a pus nas costas. Peguei o dinheiro do ônibus, o celular, meus documentos, dei um tchau rápido pra minha mãe e fui.
Bati na casa da minha tia quando já era quase uma da tarde. Aquela era a parte na qual eu não tinha pensado. Minha tia. Se ela dissesse alguma coisa, eu estava ferrada, completamente ferrada. Mas a sorte devia estar do meu lado, porque a primeira coisa que eu percebi quando a Sabrina abriu o portão pra mim foi que o carro dela não estava na garagem.
– Cadê a tia? – eu perguntei, meio ansiosa. Minha prima sorriu com satisfação.
– Você é uma cretina muito sortuda! Meus pais viajaram ontem e só voltam amanhã!
– Aliás, como vou fazer pra voltar?
– A gente leva você pra casa. Você marcou algum horário com a sua mãe?
– Sabrina, ela acha que eu to na casa da Bela! Ela vai me matar com certeza quando eu chegar de madrugada!
– Ela pode te matar depois que você tiver ido! – e deu uma piscadela – Larga de ser tão azeda, vem, a Nana ta escolhendo a roupa dela.
Ela devia ter dito “a Nana está destruindo o quarto dela”, porque foi isso que eu vi quando entrei lá. Parecia um campo de batalha. Tudo coberto de roupas, e a Giovanna experimentando, parecendo contrariada com o mundo.
Roupas legais, cintura 36 e o poder de ficar perfeita independente do que se coloque no corpo! Eu adoraria poder ser revoltada que nem ela!
– E ai, Giovanna? – cumprimentei, da porta. Tinha medo e nenhuma vontade de entrar; desnecessário dizer por quê.
– Oi, Lolita. – ela me respondeu, sem tirar os olhos do espelho. Então bufou e começou a arrancar o vestido amarelo que estava experimentando – Isso ta uma droga!
– Você é impossível! – a Sabrina exclamou, sentando na cama da irmã, sobre outra pilha de roupas. Convidou-me a sentar com ela, mas eu fiquei onde estava, com medo de ser atingida por uma bomba de seda ou coisa parecida.
Você já escolheu o que vai vestir? – a irmã perguntou em seguida, virando-se pra encará-la, com aquele olhar de “nem venha me criticar”.
– Ontem.
– Então quer fazer o favor de me ajudar? Eu tenho milhares de roupas e não consigo encontrar nada que preste!
– Você tem milhares de roupas e não consegue fazer seu cérebro se adequar a elas! – então, ela se deitou e bufou – Põe qualquer coisa! Tipo assim, você já tem namorado! Não vai lá pra pegar ninguém além dele!
Obrigada por me lembrar, Sabrina! Como se eu não pensasse nisso a cada droga de cinco minutos!
– Eu posso ficar bonita pra ele? – Giovanna insistiu, azeda. O nó na minha garganta tomou proporções grotescas, mas eu fiquei quieta.
– Vá em frente. – a outra respondeu, sem se importar. A Giovanna vestiu então um conjunto de saia e blusinha rosadas e se virou pra mim.
NÃO ME FAÇA ESSA PERGUNTA!!!!!!!!!!!!!!!!
– Acha que ele vai gostar, Lolita? – me perguntou, num tom inocente. Mas dava pra ver o ciúme e a provocação estampados na cara dela.
Cretina sortuda? Experimente burra azarada, priminha! Sua irmã está fazendo da minha vida um inferno, e a culpa é toda minha!
– Acho que ele vai gostar de qualquer coisa que você coloque. – respondi, apenas, num tom baixo demais, tentando não olhar pra ela. Mentalmente, completei: como se fosse humanamente possível te achar feia vestindo qualquer coisa que seja!
Depois disso, a cada duas provas, era pra mim que a Giovanna se virava. Eu estava realmente afim de sair correndo dali e desistir daquela festa, mas eu já tinha ido longe demais. Eu tinha dito que ia àquela festa, e faltar a ela seria pior do que ir. Não queria dar à Giovanna o gostinho de ver que estava me afetando, e certamente tudo o que eu não queria era que ela confirmasse as suas suspeitas.
No fundo, acho que o que eu esperava mesmo era não confirmar nenhuma suspeita pra mim mesma. Eu não estava convencida de nada, e tinha esperanças de que, ignorando aquele monte de sensações simultâneas sobre ela e seu namorado e meu melhor amigo Edson, talvez tudo passasse, sumisse.
Como se fosse tão simples se tratando de mim! Eu consigo transformar um rato em um ônibus se o ignorar por tempo demais! As coisas nunca correm a meu favor!
Lá pelas cinco horas, eu tomei um banho e troquei de roupa. Era humilhante me vestir e me arrumar no mesmo quarto que a Sabrina – e com a Giovanna no cômodo ao lado. Eu não vou dizer que não me acho bonita; só não sou bonita como elas! Qualquer uma das duas podia fazer uma princesa de contos de fadas se sentir um verdadeiro trapo humano! Imagine eu!
Desisti de tentar ficar à altura lá pelas seis e meia, quando já estava vestida e maquiada. O espelho gritava que eu estava um desastre, mas eu olhei pra ele e mostrei a língua. Qualquer garota no meu lugar se sentiria igual, então, eu não devia dar crédito aos meus pensamentos autodestrutivos hoje. Não hoje.
Sete horas, saímos de casa. Achei que fôssemos de ônibus, já que meus tios estavam viajando, mas pra minha surpresa, tinha um carro esperando na frente. E nem ao menos era uma droga de um táxi pra ajudar. Nada disso. Era um Corolla modelo antigo, preto meio desbotado, com o banco da frente livre e só mais uma passageira atrás – Lana.
Jesus, me salve!
Giovanna entrou no banco do passageiro, e Sabrina subiu primeiro no banco de trás. Fiquei espremida atrás da minha prima mais velha, com a visão panorâmica do rosto do Edson, sem muita empolgação, mas bonito como sempre, o cabelo meio comprido preso pra trás. Baixei o olhar rapidamente, me concentrando em questões mais banais do tipo “por que diabos ele está dirigindo?” Eu nem sabia que ele tinha carteira. Na verdade, estava me perguntando se ele sequer estava na idade de tirar a carteira de motorista.
– Você já tem dezoito, Edson? – a Sabrina perguntou por mim. Fiquei me questionando se ela tinha visto a questão estampada na minha cara, ou se ela também queria saber.
– Já, fiz em janeiro. – ele respondeu, acelerando com o carro. Era charmoso vê-lo dirigindo.
Lolita má, pare com isso!
– Legal. – a Sá suspirou e deu uma olhadinha no carro – O carro é seu?
– Não, é do meu pai.
– Hm.
Então olhei pra além dela e vi a cara emburrada da Lana, e tudo ficou claro. Ela não tinha visto nada na minha cara, nem queria saber, estava apenas fazendo um favor pra si mesma e se distraindo pra não ter que se lembrar que a garota que a odiava mortalmente no momento estava sentada bem ao lado dela.
Realmente, seria uma viagem tremendamente agradável!
Felizmente, o trânsito deu uma trégua naquele domingo, e conseguimos chegar ao clube em menos de mai hora. Edson dirigia bem, embora tivesse um fraco pela faixa do ônibus e não fosse muito fã de parar nos faróis vermelhos. Mas nunca acelerava demais, nem fazia ultrapassagens indevidas, e não causou nenhum problema enquanto o semáforo estava verde.
E, por fim, chegamos.
Edson preferiu estacionar o Corolla do lado de fora do clube. Quando deixei o carro, fiquei confusa se deveria acompanhar minha prima ou a Lana, uma vez que ambas eram minhas amigas e uma não estava falando com a outra. Me senti dividida, e isso era bem desagradável. Por fim, olhei pra Sabrina, e ela fez sinal pra que eu seguisse a Lana, já uns bons passos à nossa frente. Corri até ela.
– Oi, Lana. – cumprimentei. Ela sorriu e fez um muxoxo.
Que ótimo. Está escrito “saco de pancadas” na minha testa, droga?
– Ta estressada por causa daquela história ainda? – eu ia dizer “da Sabrina”, mas achei que isso seria bem chato se fosse ouvido lá de trás. Além disso, ela sabia muito bem do que eu estava falando. Lana bufou e virou pra mim, uma ruga funda na testa entre as sobrancelhas.
– É, eu to. – me respondeu, a voz mais tranqüila do que eu esperava. Balançou a cabeça e voltou o olhar pro chão à frente – O Diego não vem hoje.
– Por quê? – indaguei, mesmo sabendo que talvez aquilo fosse um erro. Uma pergunta errada era sinônimo de gritaria com a Lana, sempre.
– Acho que ele está bravo porque eu briguei com ele por causa daquilo.
– Desculpe, mas eu também ficaria.
E, de repente, ela me olhou, furiosa. Opa, eu tinha ido longe demais.
– Você acha que eu estou errada, Lolita? – perguntou, a voz meio alterada agora – Sinceramente!
– Calma, Lana, não disse nada disso, beleza? – mas não disse que você estava certa, tampouco. Medi bem minhas palavras antes de responder à sua pergunta – Olha, eu entendo os seus motivos. Talvez eu também ficasse puta no seu lugar, eu sei lá. Só que você está dando muito pouco crédito a uma relação de mais de um ano, não acha?
– Não é nele que eu não confio. – e olhou de esguelha pra trás, pra Sabrina. Bufei. Lembrei do que a Sabrina me disse, que ela estava ajudando o Diego e a Lana, mas eu não podia dizer nada. Primeiro porque não sabia muito mais que isso, e segundo porque a Lana não iria acreditar em mim.
– Relaxa, ok? Vamos tentar esquecer tudohoje, pelo menos hoje!
A Lana me olhou desconfiada, captando no ar uma informação que eu tinha deixado escapar. “Vamos” não tinha sido uma boa fala. Queria dizer que eu tinha coisas a esquecer também. Coisas que, no momento, andavam bem ao lado da “coisa” dela. Ela entendeu rapidinho e ficou quieta, e eu agradeci em silêncio. A última coisa que eu precisava era que a Lana me jogasse na cara o que eu não queria admitir.
Já dentro do clube, a festa estava rolando. O salão era pequeno, e só tinha espaço pra pista de dança e um balcão com bebidas. Nada pra comer. Muita gente, muita música, muita bebida, pouco espaço. Não era uma combinação das melhores.
Fomos recebidos logo de cara pela Suellen, acompanhada do meu ex-alguma-coisa Ricardo, que deu um sorrisinho torto quando passamos por ele. Dei um “oi” rápido pra Su, mas o ignorei por completo. Ele provavelmente sabia que o negócio da cola denunciada durante a prova era culpa minha, e eu queria que ele pensasse isso. O que eu tinha feito era muito pouco perto do que ele merecia que eu fizesse.
Então passamos pelo Daniel, fumando, quietinho num canto, apoiado numa mureta. Nem eu nem Lana estávamos muito animadas, então fomos até ele. Lana sentou-se na mureta ao lado dele, e eu me sentei ao lado dela. O pobre do Dani parecia tristonho. E eu sabia o motivo. Suellen, Suellen, a única garota com quem ele realmente se importava. Não fazia diferença se eles fossem parentes em primeiro grau, o Daniel sempre seria apaixonado por ela, e ela sempre faria pouco caso. Tadinho.
– E aí, Dani? – eu disse, olhando o movimento. Ele balançou a cabeça em resposta, soltando uma nuvem de fumaça.
– Isso aí é cigarro mesmo? – a Lana perguntou, com uma careta. Rolavam vários boatos de que ele usava drogas pesadas, e ele já tinha estado estranho demais pra confirmar, mas nós nunca tivemos certeza de nada.
O Daniel riu, deu uma tragada e jogou a fumaça na nossa cara. Definitivamente cigarro. Então, pra minha surpresa, a Lana esticou o braço, pegou o cigarro dele e começou a fumar também.
Tentei não deixar o queixo cair. O que ela estava fazendo? Tipo, eu não tenho problema nenhum com pessoas que fumam, mas acho isso totalmente errado! Autodestruição prazerosa? Cadê a lógica nisso?
A Lana expirou a fumaça e devolveu o cigarro. Olhou pra mim e pros meus olhos chocados, e começou a rir. Rir tipo gargalhar.
– O que foi? – eu perguntei, ainda mais confusa. O Dani parecia em alfa, alheio a tudo o que estava acontecendo, distraído.
– A sua cara foi ótima! – exclamou, apenas, e eu dei de ombros.
– Aprendi que fumar é errado. – declarei, tentando soar indiferente, mas não conseguia. A Lana pegou de volta o cigarro e tragou de novo.
– Não dizem que o proibido é mais gostoso?
– Só esqueceram de mencionar que nem sempre é o mais saudável!
– Pelo amor de Deus, Lolita, você tem 15 anos ou 50? – pegou minha mão e me deu o cigarro – Toma, tenta.
– Para com isso, Lana! – joguei o cigarro no chão e pisei em cima. O Daniel fez cara feia primeiro, depois puxou outro do bolso e acendeu – Vou tomar alguma coisa.
– Beber também é errado!
– Tchau, Lana!
Me afastei, mas ela veio comigo. Eu tinha certeza de que a Lana não estava no seu normal. Ela era o tipo certinha e intelectual, não a porra louca que sai por ai fumando. Ela devia estar completamente alterada com essa crise de ciúmes por causa da Sabrina.
Mas, no fim das contas, ela tinha razão. O proibido era mesmo mais gostoso, e eu estava caminhando pra mais uma coisa que eu tinha aprendido a não fazer: beber. Eu tinha 15 anos e nunca tinha tomado mais que um copo de alguma coisa alcoólica. Aquilo não era lá muito comum nesse meu século vinte e um. Não sou muito Maria-vai-com-as-outras, mas me senti tentada a experimentar, só daquela vez.
Ora, eu queria ou não esquecer? Quem liga se beber é certo ou errado?
Então, ao invés de eu pegar só um copo, eu peguei uma garrafa.
Os relatos a seguir são imprecisos, devido ao excesso de álcool consumido pela narradora desta história. Qualquer semelhança com a realidade NÃO É mera coincidência. Nunca são.
Eu nem sei como a primeira garrafa acabou, mas sei que eu não terminei com ela sozinha. Eu ainda estava bem consciente, só bem mais lenta. Então, a Lana foi buscar uma outra garrafa pra gente.
O Daniel estava parado exatamente no mesmo lugar, fumando e bebendo enquanto a festa fervia. Depois de um tempo, a Bela passou, levando o Willian consigo. Parou quando percebeu que a garota torta escondida numa nuvem de fumaça de cigarro do cara ao lado era eu. Fez uma careta.
– E ai, Lolita? – arriscou. Atrás dela, o Willian ria da minha cara.
Levantei a mão, mas não disse nada. Eu não estava muito afim de mexer a boca, sabe como é.
– Então… você… – abafou uma risada, e se recompôs – Vai ficar aí sentada com o Daniel?
Foi nesse momento que a Lana chegou. Desta vez com duas garrafas. Eu nem olhei o que era, só comecei a abri-la, sem sucesso. O Willian tirou-a das minhas mãos e a abriu antes que eu causasse algum acidente com ela. Me devolveu, e eu dei um gole.
Aquilo era boooom
– Você bebe? – a Bela me perguntou, meio descrente. Certo, vindo dela isso era mesmo uma piada!
– Você não bebe? – perguntei, notando que a minha voz saía meio grave demais – Que engraçado. – e comecei a rir – Você viu que engraçado?
– O que é engraçado? – embora ela também estivesse rindo, e a Lana também, e o Willian e todo mundo num raio de dez metros que pudesse me ouvir.
– Minha voz! Hihi!
– Tchau, Lolita!
– Tchau, Belaaaa…
Minha voz foi sumindo, e eu bebi mais um pouco. Ainda rindo, bati minha garrafa na da Lana. O tilintar me deu vontade de rir, e a minha risada me deu mais vontade ainda. Tudo era muito engraçado, e o que quer que houvesse naquela garrafinha era bem gostoso.
As luzes picando eram engraçadas, mas me deixavam meio tonta. Vi a Lana dançando, e entendi que talvez dançar melhorasse a tontura. Comecei a me mexer e a pular, mas não ajudou muito. Na verdade, meu estômago estava uma droga.
Alguém esbarrou em mim, e eu xinguei. Não sei a quem exatamente. Eu não estava enxergando muito. Talvez eu precisasse de óculos.
                                                            
Ok, eu estava bem mal agora!
Tinha alguém segurando o meu cabelo enquanto eu encarava o vaso sanitário. O fundo branco e a água me encaravam, enquanto o estômago gritava e eu pedia pra vomitar, mas não saia nada.
Meu Deus, quanto eu tinha bebido? A propósito, de quem era aquele banheiro?
Eu ainda estava escutando um barulho, então eu acho que não devia ter saído daquela festa… onde era a festa mesmo?
O celular vibrou e tocou, mas ninguém atendeu. Fez eco, e eu sabia exatamente quem estava me ligando e como eu estava ferrada, mas tudo bem. No momento, eu só precisava vomitar.
– Perdeu a vontade? – uma voz perguntou atrás de mim. Acho que era Bela, mas meus ouvidos estavam abafados, como ficam quando a gente passa muito tempo perto duma caixa de som.
– Não sai… – gemi, de um jeito meio anasalado. Eu estava torta, mas estava falando a verdade.
Então Bela, ou tanto faz quem estava comigo, puxou minha cabeça pra trás e enfiou o dedo na minha boca semi-aberta.
E aí eu vomitei. Muito.
– Lolita, nós chegamos.
Me cutucaram várias vezes, e eu vi que estava na frente do meu prédio. Ótimo. Devia ser umas 4 da manhã, duma manhã de segunda-feira, e minha mãe obviamente estaria puta da vida!
Se é que ela estava acordada, o que já servia de consolo.
O Edson, o mais são de todos nós porque estava ao volante, deu a volta e abriu a porta pra que eu descesse do carro. Eu cambaleei, e recusei sua mão quando ele tentou me ajudar. Meu estômago estava revirado, minha cabeça estava doendo e a minha boca parecia um deserto. Perfeito!
Então eu segui, meio torta demais, até entrar no prédio, e de lá me segurei pra não cair até chegar no elevador. A única coisa que eu mantinha em mente era: não caia, não durma. Deixe pra fazer isso quando chegar em casa. Pelas próximas duas horas antes de ir à escola.
Meu Deus, eu estava completamente ferrada!
Me mantive de olhos abertos enquanto aquele elevador idiota subia até o meu andar, e precisei de cinco minutos inteiros pra achar a chave e enfiá-la na fechadura. Fui meio barulhenta demais quando entrei em casa, mas tudo bem. Abri, entrei, tranquei a porta e tirei os sapatos.

E desabei no sofá.

[continua…. em 06/10]

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