Todo mundo tem um caso de amor confuso. Aquela eterna relação de amor e ódio que te define ao mesmo tempo como uma pessoa apaixonada, e como um ser humano completamente maluco. Você sabe, um amor que nem você entende às vezes, mas que ao mesmo tempo está enraizado em você tão profundamente que é impossível se desfazer dele, mesmo que você queira.
De certo modo, é assim minha relação com a cidade de São Paulo.
Eu nasci e fui criada em São Paulo, a grande metrópole brasileira, quinta maior cidade do mundo. Houve um tempo em que Sampa – ou melhor, a pequena parcela dela que eu conhecia, ali no meu cantinho da Zona Sul – era todo o meu mundo. Eu sabia da existência de outras cidades, mas não as conhecia e, portanto, era quase como se elas não existissem. E eu não precisava que existissem. Eu tinha São Paulo.
Cresci. Conheci outras cidades – Rio, BH, Floripa, Porto Alegre, Recife – e visitei outros países – Canadá, Itália, Malta, França, Áustria -, vi lugares lindos pelos quais eu me apaixonei; mas nada nunca foi tão bom quanto voltar pra casa. São Paulo. Minha casa. Com todos os defeitos e problemas que a nossa casa tem, da goteira no teto ao chão sujo que ninguém nunca se dá ao trabalho de limpar, a casa da gente é sempre o melhor lugar do mundo. É assim que São Paulo é pra mim.
Sou paulistana, de alma, criação e coração. Falo “bolacha” ao invés de “biscoito”, ando atropelando as pessoas, saio com 2h de antecedência pra qualquer lugar, reclamo do trânsito, saio com casaco e guarda-chuva até no dia mais quente de verão, chamo “semáforo” de “farol”, acho que não tenho sotaque e tenho todos esses pequenos detalhes que fazem de qualquer paulistano exatamente quem ele é: único e comum, eu e todo mundo. Tento até sair dessa minha zona de conforto durante o meu trabalho, mas invariavelmente eu e minhas personagens acabamos sempre voltando pra ela; a Sampa, a metrópole, a cidade tão rica e tão cheia que pode abrigar todas as pessoas e todas as histórias, que abraça e expulsa seus amores na mesma medida. Não dá pra evitar. É o coração que chama mais alto.
Um caso de amor e de ódio com a cidade, eterno e inevitável. Assim sou eu e minha Sampa. Há 22 anos comigo, e há 460 anos com o mundo.