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Faz um frio insuportável enquanto minha família e eu nos reunimos à entrada do palácio para receber a comitiva de meu futuro marido. A brisa gélida parece penetrar as várias camadas de tecido de meu vestido, chegando à minha pele sob a saia e as anáguas, tocando meu pescoço exposto e esvoaçando os fios do meu cabelo. Tremo, e mamãe interpreta meu tremor involuntário como
obra do nervosismo.
— Está tudo bem, querida. Tenho certeza de que o arquiduque gostará de você. — Ela põe a mão enluvada sobre as minhas, entrelaçadas delicadamente.
Encaro mamãe em silêncio, incapaz de dizer a ela que o único motivo pelo qual estou tremendo é ser obrigada a esperar em pé, neste frio congelante, pela chegada do arquiduque. Mamãe é uma mulher de rosto gentil e feições banais demais para alguém que já foi imperatriz consorte do Brasil. Ela solta minhas mãos e ajeita rapidamente alguns fios castanhos de cabelo que escaparam do chapéu, e então torna a olhar para a frente, absolutamente serena.
Além de nós duas, nossas damas de companhia e alguns empregados também aguardam a chegada do arquiduque. Apesar de não estar exatamente ansiosa pela sua chegada, devo admitir que estou um anto curiosa em conhecê-lo, afinal nosso casamento se dará daqui a dois meses e ainda não sei como ele se parece. A ser bem justa, nos encontramos uma vez, muitos anos atrás. Contudo, duvido muito de que as memórias de minha infância façam jus ao cavalheiro que estou prestes a conhecer.
A verdade é que há poucas coisas neste mundo por que eu anseie menos do que esse casamento. Motivos não faltam, como só ter visto o noivo uma única vez, ou o fato de o matrimônio ser arranjado. Talvez eu leia romances demais, ou talvez o amor de meus pais me tenha cegado para as verdades da vida. Mas, ainda assim, eu acredito que uniões sem paixão não deveriam existir. Como posso esperar me apaixonar por alguém em tão pouco tempo?
Sinto minhas pernas adormecerem por conta do frio, e estou por um triz de proferir uma reclamação pouco elegante sobre a demora quando, finalmente, ouço os cavalos e avisto a primeira carruagem. Respiro fundo, sentindo o espartilho comprimir meu peito. Aliso uma ruga inexistente em meu vestido e cruzo as mãos em frente ao corpo.
Nos instantes que precedem a parada da carruagem, faço uma prece silenciosa para que meu noivo não seja um completo desastre. Por favor, Deus, que ele seja agradável. Que tenhamos gostos em comum. E, pelo que é mais sagrado, que ele ao menos goste de ler. Creio ser capaz de ignorar muitas falhas em um homem, mas não a falta de gosto pela literatura.
Engulo em seco quando a carruagem contorna o jardim e breca à nossa frente. De soslaio, vejo que mamãe permanece imóvel com seu sorriso complacente, tão agradável quanto as nossas três damas de companhia, que parecem muito contentes com a chegada de nossos visitantes. Creio que também estaria, se tais visitas não decretassem meu futuro. Como deve ser bom poder escolher quem se ama, com quem se casa e até mesmo o que se diz. Felizes são elas, penso, livres para desposar quem quiserem. Trocaria de lugar com qualquer uma delas em um piscar de olhos, se tivesse a chance.
Pisco diversas vezes para avivar a mente e dissipar tais bobagens. Preciso me conformar. Culpo de novo o frio e estremeço ao pensar em meu destino, mas contenho-me, o semblante permanecendo impassível enquanto o cocheiro se adianta e abre a porta da carruagem para que meu futuro marido e eu possamos enfim nos conhecer.
~*~
Klaus
Observo os jardins enquanto a carruagem sacoleja rumo à entrada do Palácio das Janelas Verdes. As flores e as folhagens são decididamente sem graça quando comparadas a qualquer lugar da corte austríaca. Embora o clima frio me seja familiar, sinto falta de casa. Jamais perdoarei Maximiliano por me arrastar com ele nesta viagem.
— Ansioso para conhecer sua futura esposa, meu caro? — brinco, abrindo um sorriso debochado.
— Não use esse tom, por favor. — Maximiliano torce o nariz, e seu bigode já proeminente dá a ele a estranha aparência de um leão-marinho desconfiado. — Soa como uma sentença de morte.
— E é, meu amigo. — A carruagem dá um tranco e o solavanco me faz planar por um instante antes de atingir o assento novamente. — Especialmente com essa aí. Dizem que tem uma língua ferina para compensar o rostinho bonito. Eu é que não gostaria de estar no seu lugar.
— Fique quieto — ele ralha comigo, e solto um risinho baixo antes de me calar.
Maximiliano Habsburgo é meu amigo mais antigo, embora não estejamos em posições semelhantes perante a nobreza. Enquanto ele é arquiduque da Áustria, eu sou o herdeiro de um marquesado em decadência. O gosto por boa bebida e cavalos de raça nos aproximou, e hoje somos amigos o suficiente para que eu saiba uma ou duas coisas a seu respeito — por exemplo, quanto ele está se obrigando a levar adiante esta falácia disfarçada de noivado, mesmo estando secretamente apaixonado por outra mulher.
A carruagem estaciona e nós descemos. Maximiliano vai na frente, parecendo altivo e imponente em seu uniforme da marinha. Desço em seguida. Noto primeiro o palácio, uma construção tão insossa quanto os jardins que a envolvem, tão banal que poderia facilmente ter sido minha casa em Salisburgo. Logo na entrada, há um pequeno grupo de pessoas; atrás estão os empregados, seguidos por três moças jovens e belas que assumo serem as damas de companhia, e então, à frente, estão a futura esposa e a futura sogra de meu amigo.
— É um prazer reencontrá-la, Vossa Alteza — Maximiliano diz nervosamente para a noiva, enquanto faz uma mesura. — Majestade. — Ele se volta para a sogra. — Permitam-me apresentar meu bom amigo Klaus Brachmann, filho e herdeiro de Ernesto, marquês da Áustria.
— É um prazer. — Posto-me ao lado de Maximiliano e, primeiro, faço uma mesura para a mãe, Sua Majestade Imperial, dona Amélia, duquesa de Bragança e imperatriz-viúva do Brasil. Uma mulher de traços gentis e ordinários, em seu vestido azul-escuro, as mangas longas sendo a única coisa a protegê-la do frio. Apesar de sua aparência estar muito aquém do que se esperaria de uma
imperatriz, ela irradia um ar maternal e sincero.
E então me viro para encarar a leoa. Sua Alteza, dona Maria Amélia de Bragança, princesa do Brasil. Ao contrário da mãe, a princesa tem traços dignos da realeza, das maçãs do rosto finas e proeminentes até a postura firme e o corpo claramente bem talhado sob o vestido amarelo. Ela me cumprimenta com um sorriso suave, embora não indiferente, os olhos azuis se estreitando para mim.
Tento não lhe dar muita atenção — ela é, afinal, a futura esposa de meu melhor amigo — e desvio o olhar para algo mais palpável. Enfileiradas ao lado da imperatriz-viúva, as damas de companhia sorriem e encaram-me sem a menor discrição. Enquanto Maximiliano e dona Amélia trocam palavras afáveis e casuais sobre a viagem, observo as moças abertamente, lançando meu melhor sorriso.
A primeira delas é baixa e esguia, tão diminuta que parece uma criança, com os cabelos cor de mel em cachos aprumados. Ao seu lado, um tanto mais alta e corpulenta, uma moça de rosto sardento e olhos claros, com os cabelos castanhos tão repuxados para trás que seu rosto parece esticado. Mas é na última que meu olhar mais se demora. Com os cabelos escuros ajeitados em um penteado impecável, ela é a única que não sorri; encara-me com olhar direto e decidido, que parece despir-me. Ela é, talvez, magra demais, as maçãs do rosto saltadas e os seios achatados, mas tenho um fraco por mulheres que sabem o que querem. Determinação pode ser bastante sedutor.
Talvez nossa estadia não venha a ser assim tão tediosa.
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