O Diário (nada) Secreto – Capítulo 2

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Capítulo 2 – Jogo de Interesses
OXIGÊNIO, ONDE DIABOS ESTÁ VOCÊ QUANDO EU PRECISO?
Eu abri a boca pra responder, enquanto ficava vermelha como um pimentão, mas o meu cérebro não conseguia processar nada coerente pra responder. Ao invés disso, ele ficava gritando repetidamente:
ELE FALOU COMIGO, ELE FALOU COMIGO, ELE FALOU COMIGO, ELE FALOU COMIGO, ELE FALOU COMIGO, ELE FALOU COMIGO, ELE FALOU COMIGO, ELE FALOU COMIGO, ELE FALOU COMIGO, ELE FALOU COMIGO, ELE FALOU COMIGO!!!!!
– E ai, cara? – escutei o Willian dizer, e eu o amaldiçoei por existir. O Ricardo respondeu, inicialmente sem desprender os olhos de mim:
– Beleza? – só então se virou, e cumprimentou o amigo – Fala, Dani!
– Tudo tranqüilo! – o Daniel disse, batendo na mão do Ricardo – E tu, Lolita?
Demorei alguns segundos pra perceber que o Daniel estava falando comigo. Eu me virei pra ele e dei um sorrisinho.
– Eu to legal. – minha voz saiu aguda, tímida.
Que beleza!
– Depois de dois anos… – o Ricardo disse, e eu travei – Estamos na mesma sala de novo. Legal isso, né?
– É… – foi o máximo que eu consegui dizer.
Então o professor começou a falar e todo mundo calou a boca.
Desnecessário dizer que eu não escutei uma única palavra de nada do que o professor estava dizendo. Não precisava. Não queria. Eu tinha um ser humano absolutamente perfeito bem na minha frente, que tinha falado comigo, e isso era tudo de mais importante!
O resto era o resto.
Quando o sinal tocou anunciando o intervalo e os três garotos já estavam fora da sala, a primeira coisa que eu fiz foi me virar pra Bela, enfiar o dedo na cara dela e dizer, bem alto:
– EU DISSE!
Ela deu um tapa no meu dedo e fechou a cara.
– Isso não quer dizer nada! – insistiu – Ele disse duas frases inteiras pra você e você respondeu como uma débil-mental. Maravilhoso!
– Quem era aquele? – a Giovanna perguntou, então.
– É a paixonite da sua prima. – a Bela respondeu, com um risinho sarcástico.
– Esse é o cara do primeiro beijo? – foi a vez da Sabrina perguntar, meio impressionada. Eu confirmei – Meu Deus, Lolita, ele é muito gato!
– Realmente! – concordei.
– Você simplesmente tem que ficar com ele de novo!
– Esse é o plano!
– Eu acho injusto! – a Giovanna brincou, fazendo beicinho – Se você pegar o mais gato, o que sobra pra gente?
– Os menos gatos? – sugeri, e ela me deu um tabefe na cabeça. Me levantei e nós quatro saímos da sala em direção às escadas – Tem outros nessa escola!
– Não vi nenhum até agora!
– A Gi está com crise de carência! – disse a minha outra prima – Ela quer um alvo pra chamar atenção!
– A Gi não precisa de um alvo pra chamar atenção! – exclamei, inconformada – Duvido que você não seja a mais cotada antes do fim do mês!
– Obrigada pelos elogios, mas mesmo assim. – e então suspirou – Não tem graça chamar atenção só por chamar. Eu quero chamar a atenção de alguém!
A Bela empurrou as portas do refeitório e apontou para a massa de alunos do ensino médio.
– Então sirva-se.
Nós quatro rimos e fomos nos sentar na única mesa livre que pudemos encontrar. Mal nos acomodamos e a Lana surgiu, os cabelos negros presos num rabo alto, os olhos verde-escuros brilhando, um sorriso perfeito no rosto. Carregava uma sacola como se a mesma fosse sua vida.
– Oi meninas! – ela disse, e se sentou conosco.
– E ai, Lana? – cumprimentei. A Bela apenas deu um aceno e um sorriso desajeitados – Minhas primas, Sabrina e Giovanna.
As duas sorriram.
– Primas? – Lana as estudou com olhos cuidadosos, provavelmente procurando por alguma semelhança entre nós – Bem, nesse caso, acho que você vai querer levá-las pra minha festa, certo?
– Festa? – os olhinhos da Giovanna brilharam. Pelo visto, “Festa” era a palavra mágica.
– Eu faço quinze anos no mês que vem, então vai rolar uma festa pra comemorar. – então tirou dois convites prateados de dentro da sacola, dando um para mim e outro para Bela. Em seguida, pegou mais dois e entregou um pra cada uma das minhas primas.
– Rebecca? – Sabrina leu, rindo.
– Pelo menos você é mulher! – a Giovanna exclamou, erguendo as sobrancelhas finas – João Felipe? Ta brincando!
– São da sala do meu irmão, eu não preciso realmente convidá-los se eu não quiser! – a Lana não parecia se importar. E, outra vez, os olhos da minha prima brilharam.
– Irmãos? – indagou – Você tem irmãos?
– Dois mais velhos. – Lana me olhou, e depois novamente para elas – Por quê?
E as minhas duas primas já estavam com aquela cara de quem está planejando algo.
– Onde? – Sabrina perguntou, e a Lana esticou o pescoço pra encontrá-los.
– Ali. – e apontou pra uma mesa do outro lado do refeitório, onde dois garotos nada parecidos estavam sentados – Bom, vou terminar de entregar meus convites. Até depois, meninas!
E, enquanto a Lana ia embora, as outras duas já estavam confabulando.
– Você! – e a Giovanna apontou direto pra mim – Você conhece aqueles dois?
– Ah, sim! – eu disse, baixando o dedo dela. Ao meu lado, a Bela ria.
– Do que você ta rindo? – a Sabrina perguntou, rindo também, ainda que não soubesse por quê. Ela fazia isso com freqüência.
– Posso responder, Lolita? – Bela me perguntou, soando petulante. Eu lancei-lhe um olhar fuzilante.
Não começa! – adverti, e ela gargalhou.
– Agora eu quero saber! – minha prima mais nova insistiu – Qual é?
– É tudo mentira! – eu quase gritei, ao mesmo tempo em que a Bela dizia:
– Todo mundo sabe que o Edson morre pela Lolita, e só ela não quer enxergar isso!
– Qual deles é o Edson? – a Nana quis saber, encarando a mesa onde os dois estavam sentados, ao mesmo tempo em que roia as unhas.
– O cabeludo, mas é claro que isso é o maior papo furado! – respondi, indignada e corada, o coração acelerado pela mera menção ao assunto – O cara pediu pra ficar comigo uma vez, na festa de 13 anos da Lana, mas e daí? A gente não se fala direito a um bom tempo!
– Vocês eram melhores amigos! – Bela observou, e eu gaguejei um pouco pra tentar encontrar algo que se opusesse àquilo.
– É, mas, bom… – bufei, enquanto as três riam da minha cara – Olha, já faz tempo, ta? Ele simplesmente parou de falar comigo. Ponto.
– Então você não ia, sei lá, se importar se… – a loira sugeriu, e eu me apressei em negar.
– Claro que não! Vai fundo!
– Então que tal uma ajudinha?
– Que tipo de ajuda?
Ah, sim, eu acabo de arranjar mais uma razão pra odiar MUITO o mês de fevereiro.
Querem saber qual?
PORQUE, A PARTIR DESTE MÊS, EU TENHO QUE ME EMPENHAR EM SER NOVAMENTE AMELHOR AMIGA DO EDSON, PRA QUE AS MINHAS PRIMAS TENHAM CONTATO COM ELE.
Ótimo, realmente ótimo ser usada dessa maneira.
Então, naquele dia, eu “acidentalmente” perdi o ônibus da escola pra casa. No ponto de ônibus do outro lado da rua, estavam a Lana, o Henry e o Edson, e lá fui eu.
– Que foi? – a Lana pareceu bem surpresa em me ver, mas nenhum dos outros dois pareceu mostrar real interesse. Eu me postei entre ela e o Edson, que sequer se moveu – Perdeu o ônibus?
– Pois é… – eu disse, sem ânimo, remexendo minhas coisas em busca de uns trocados – Então, lá vamos nós.
Então, fez-se silêncio.
Olhei pro lado – e pra cima, o Edson era um cara bem alto – e decidi que talvez fosse uma boa hora pra dizer alguma coisa, puxar assunto com ele, já que eu tinha me proposto a recuperar aquela amizade por não somente interesse próprio. Ele deve ter sentido que eu o estava encarando, porque baixou os olhos e me olhou, de um jeito estranho, difícil de entender.
– Tudo bom? – eu perguntei.
– Tudo. – ele respondeu, com aquele tom de voz de quem conta uma piada. Riu consigo mesmo – Você fala comigo agora?
Você fala comigo agora? – retruquei, e ele ficou sério de novo.
– Eu achei que você preferisse…outras companhias.
– Achou errado. – fiz sinal pro meu ônibus, que vinha vindo – Talvez você precise fazer terapia pra parar de achar tanto. E me ouvir, só pra variar.
– O que você… – ele começou a falar, mas o ônibus parou e abriu a porta.
– Tchau! – e dei um sorriso falso, amargo.
Subi, corando e bufando.
É, eu não tinha contado nem um quarto da história real pra Giovanna e pra Sabrina. Tinha muito mais confusão no rolo eu-Edson do que elas poderiam jamais imaginar. Era algo que eu odiava me lembrar, pois tinha sido estúpido.
Sim, nós dois éramos melhores amigos. Até uma certa época, antes do Diego entrar na escola e grudar na Lana e eles começarem a namorar, eu, ela e a Bela éramos companheiras pra praticamente tudo, então eu estava quase sempre enfiada na casa de uma das duas. Foi por isso que eu comecei a conversar com o Edson.
E ele se mostrou um cara legal, fácil de lidar, de conviver. A gente conversava muito, e sempre, e ele sabia tudo sobre mim e eu sabia tudo sobre ele. Quando eu tinha onze anos e ele treze, ele me fazia escutar os clássicos do rock com ele, enquanto a gente jogava tranca ou 21, esperando a Lana tomar banho, ou a Bela chegar pra fazer algum trabalho. Viramos super-amigos.
É claro que isso implicava em contar segredos, e nós não tínhamos problemas com isso. O Edson foi um dos primeiros a saber das coisas mais idiotas e/ou importantes da minha vida, tipo meus micos, minhas paixonites, até a minha primeira menstruação – ele riu bastante dessa. E eu também fui a primeira a saber sobre o primeiro beijo dele, as coisas que ele aprontava, as garotas que ele ficava afim, as mentiras que ele contava pros pais.
Até, claro, o Ricardo surgir na minha vida.
Eu me apaixonei na mesma semana, e na mesma semana, o Edson ficou sabendo. Ele aprovou de início, mas começou a encher muito o meu saco depois de conhecer o Ricardo – disse que ele não era pra mim, que eu merecia cara melhor. Quando o Ricardo pediu pra ficar comigo e eu aceitei, tudo o que ele fez foi aquela expressão de “eu te disse”. Quase não quis ouvir quando fui contar sobre o primeiro beijo. Parecia com raiva.
Eu descobri o que estava errado na festa de aniversário da Lana, dois dias depois. Ele me chamou pra conversar e disse que estava afim de mim. Pediu pra ficar comigo. Eu não aceitei, disse que não podia, que não queria, que ele sabia de quem eu gostava. Deixei ele falando sozinho no mesmo quarto dos fundos onde tantas vezes a gente tinha passado horas jogando videogame, e fui atrás do Ricardo.
O Edson nunca me perdoou por isso. Não por ter negado, mas por ter sido grosseira – sim, eu fui – e principalmente por ter dado as costas a ele. Nossa amizade acabou ali.
Céus, eu devia parecer mesmo muito cretina aos olhos dele! Mas o que havia de errado em reatar uma amizade, afinal?
Por interesse? Tudo.
– Certo, vamos por partes!
O que era mais estranho àquela altura do campeonato? Eu estar me aproximando do Edson pra ajudar as minhas primas a chegarem nele, ou a Lana estar me ligando no meio da tarde, depois de um dia cheio de tarefas?
– Do que você está falando? – perguntei eu, sentando no sofá.
– Lolita, o que foi aquilo hoje? – ah, sim, era disso – Você e o meu irmão não se falam há, tipo assim, dois anos!
– É, eu sei. – suspirei – Sei lá, mas é estranho, certo?
– O quê, vocês não se falarem ou você ter falado com ele hoje? Pessoalmente, eu acho a segunda opção muito mais estranha!
– As duas coisas. Você não acha que ele foi, sei lá, muito radical? Tipo, estragar a amizade por nada?
– Não foi por nada! – a Lana deu uma risada inconformada – Lolita, meu irmão realmente gostavade você! Você podia ter feito tudo com ele, menos ter sido tão direta! Machucou pra valer!
– Ta bom, Lana, mas olha quanto tempo já passou! – insisti – Ele também não foi nada fácil, você sabe!
– Olha, vocês que se resolvam! – exclamou, por fim – Mas sério, o que te deu hoje de simplesmente perguntar alguma coisa?
– A questão é o que deu nele pra ter me respondido! – rolei os olhos – Eu não estou fazendo isso só por mim.
– Suas primas?
– É. Você ta bem perceptiva, hein?
– Eu tento. Você acha que usar o meu irmão desse jeito vai adiantar pra alguma coisa?
– A usada aqui sou eu! E, sinceramente, eu não sei. Você acha que elas têm alguma chance?
– Eu não sei, é…perai!
O telefone ficou mudo um instante, depois escutei a Lana gritando alguma coisa. Mais uns segundos, e ela pegou o telefone de novo.
– Ah, Lolita… – ela parecia com vontade de rir.
– O quê? – fiz uma careta, e então outra voz entrou na linha.
– Lana, desliga. – epa!
Que maravilha!
– Oi, Lolita. – o Edson disse, do outro lado da linha – Lana, desliga!
– Tudo bem, calma!
Ouve um barulho chato de telefone sendo colocado no gancho, e então silêncio. Eu estava petrificada demais pra falar.
– Eu achei besteira ir pra terapia, então achei melhor… – ele bufou, e parou por um minuto. Eu não conseguia falar – Achei que talvez eu devesse te ouvir.
– Eh… – consegui soltar, e aos poucos as palavras vieram – Obrigada. Eu acho.
– Sou todo ouvidos. – afirmou então.
Certo. Desculpas, explicações, motivos, e o mais importante, pedir pra tentar de novo, de modo que minhas primas – principalmente a Giovanna – não me matassem completamente.
– Edson, olha… – era bem difícil. Principalmente porque eu não sabia se me arrependia do que tinha feito – Eu sei que não tem desculpa. Pro que aconteceu. Há dois anos atrás.
Ele fez um muxoxo, e eu tive que aceitar isso como resposta.
– Foi tudo muito do nada, você entende? – continuei – A gente era amigo, e você sabia das coisas que estavam acontecendo, então eu meio que não pude reagir diferente quando você me disse…aquilo tudo.
– Você sabe que não foi esse o problema! – ele disse, com a voz amarga.
– É, eu não fui legal em te deixar falando sozinho! – concordei, a contragosto – Mas, na boa, o que você queria que eu fizesse? Que eu ficasse ali, olhando pra sua cara sem dizer nada?
– Não, mas…
– Então pra que tanta frescura? – agora eu estava empolgada – A gente era tão amigo, Edson! Eu sei que eu errei, e eu realmente quero que você me desculpe por isso! Agora, será que dá pra gente esquecer o que ficou pra trás?
– O que você quer?
– Ser sua amiga de novo. Talvez não como antes, mas…sei lá, no mínimo que a gente se fale, né?
Um minuto de silêncio.
– E ai? – insisti, o coração apertado.
– Acho… – ele disse, baixinho, e depois mais alto – Acho que sim.
– Ótimo. – eu sorri, mais aliviada do que acreditei que estaria – A gente se vê na escola.
E desliguei.
– E ai eu desliguei o telefone. – eu terminei, com um suspiro, de contar o acontecimento daquela tarde na manhã do dia seguinte, no ônibus, pra Bela. Ela estava quase tão em choque quanto eu.
– Vocês são estranhos. – concluiu.
– Você é estranha! – brinquei – E o castigo?
– Numa boa. Eu ainda tenho o meu violão.
– Você não sabe tocar violão, de que adianta?
– A sua prima…como é mesmo o nome dela?
– A Sabrina?
– Ela sabe. Disse que vai me dar umas aulas.
– Bom…
A conversa parou por ai.
Chegamos na escola praticamente ao mesmo tempo em que a Lana chegava com os irmãos. Pela primeira vez em algum tempo, eu andei diretamente até eles, ao invés de esperar que a Lana estivesse sozinha. Os três sorriram quando eu me aproximei.
– Oi, Lolita. – o Henry disse, me dando um beijo rápido no rosto, antes de entrar no Santa.
– Bom dia, Lolita! – a Lana exclamou, com a voz animada e um sorriso presunçoso. Eu fiz de conta que não percebi e a cumprimentei, e então ela também adentrou o colégio.
Demorou um instante antes do mesmo acontecer com o Edson, fosse porque nem eu nem ele sabíamos como começar, fosse porque era realmente estranho estarmos nos falando de novo. Por fim, eu me cansei e tomei a atitude.
– Oi. – eu disse, como quem insinua que cumprimentar os outros é também uma questão de educação.
– Oi. – ele me respondeu, com aquela cara de quem ainda não consegue acreditar que tudo está do jeito que está.
– Então… – eu comecei a dizer, e ele me interrompeu.
– Sem brigas. – declarou, e eu pude respirar aliviada – Numa boa. Do zero.
– Valeu.
Me virei pra entrar, e ele veio atrás de mim.
Me senti como um verdadeiro ET, sendo observada por cada um dos rostos fofoqueiros do Santa Rita. Enquanto subíamos as escadas, passamos pela Ariane, uma garotinha detestável do segundo ano que sabia tudo da vida de todo mundo. Toda intriga que começava tinha que obrigatoriamente passar por ela, portanto nunca se sabia o que era ou não verdade das coisas que rolavam de boa em boca no colégio.
Quando chegamos ao pátio principal, a coisa piorou. Porque, pelo visto, todos já estavam alertas à nova mudança nos fatos, do mesmo modo como tinham estado quando eu e ele paramos de nos falar.
De longe, vi a Suellen ficando meio boquiaberta, e a Lua cochichando qualquer coisa no seu ouvido. Vi a Lana se segurando pra não rir, ao lado do Diego, que parecia perfeitamente indiferente. Vi o Henry falando com os caras da sala dele, e virando pra nos olhar. A Bela olhava de um modo quase tão descrente quanto a irmã gêmea, e as minhas primas comemoravam.
Principalmente, eu vi muito bem quando o Ricardo nos olhou de soslaio. Irritado, inconformado. Meu ego inflou ao pensar na possibilidade de ser ciúmes.
Até que aquilo poderia ser de interesse geral, afinal.
Eu fui me juntar às minhas primas e à Bela e, pra minha total surpresa, o Edson veio atrás. Largou a mochila no chão e se sentou entre mim e a Giovanna, que quase não conseguia disfarçar a animação.
O silêncio se instalou por uns instantes enquanto eu e as meninas travávamos uma batalha com os olhos. Virei-me para a Bela.
“Como isso é possível?”, os olhos dela me perguntavam. “Não sei”, os meus respondiam. Então, discretamente, olhei pra Giovanna.
“Ele é gato!”, foi a primeira coisa que pude ler ali, enquanto ela olhava diretamente para o único homem na mesa. Depois me olhou, e a expressão mudou. “Você é genial!”
A Sabrina parecia mais tranqüila. Partilhava da opinião da irmã sobre o Edson, mas não parecia tão fissurada quanto ela. De fato, quando nós nos olhamos, o que eu pude ver foi um “tanto faz”, seguido de um desesperado pedido: “Controle esta maluca!”
Claro, isso seria perfeitamente possível!
– Então… – o Edson disse, passando a mão no cabelo meio comprido de roqueiro dele – Primas, hã?
E apontou pras duas.
– Já chegou até você? – indaguei, não muito impressionada.
– As notícias decolam aqui dentro. – respondeu, simplesmente, meio que traduzindo meu pensamento.
– Giovanna e Sabrina.
– Oi. – a primeira disse, abrindo um sorriso capaz de fazer derreter o coração mais duro. A Sabrina se limitou a sorrir.
Algo me dizia que agora eu não precisava mais me preocupar com aquilo. Por enquanto.
– Você e o Met tão de rolo? – foi a primeira pergunta que me fizeram na sala.
Era aula vaga de história, a professora tinha faltado. A Bela estava no banheiro, o Ricardo estava jogando Game Boy, e a Suellen e a Lua acharam que vir me incomodar era uma boa idéia. Agora eu estava de boca aberta, com a resposta na ponta da língua, e sem saber o que responder.
E antes que alguém me pergunte, Met é o apelido que algumas pessoas deram ao Edson. Pra maior parte das meninas ele é simplesmente o Dinho, mas ele ficou bem rotulado por ser metaleiro, e como esse adjetivo era comprido demais pra ser usado em conversas casuais, foi abreviado simplesmente pra Met.
– De onde surgiu isso? – eu resolvi perguntar antes. As duas trocaram olhares rápidos.
– Ouvimos falar. – a Lua declarou, e eu sabia o que aquilo queria dizer. Que elas tinham inventado.
– Vocês não se falam há, tipo assim, mil anos, Lolita! – a Su exclamou, rolando os olhos de um jeito que a fazia parecer muito, muito estúpida. Ela sempre parecia estúpida quando tentava mostrar que algo era muito óbvio – As pessoas falam!
– Mas estão, não estão? – a Lua insistiu, e eu suspirei, voltando pra posição correta na carteira, encarando a parede (e o perfil do Ricardo) – Ele sempre gostou de você, e agora que você e o… – eu lhe lancei um olhar penetrante e ela reformulou a frase – Agora que você ta solteira, sei lá, podia ser que…
– Nem mais uma palavra! – pedi, e as duas ficaram sérias – Eu e o Met somos amigos e só. A gente voltou a se falar e só. Felizes?
Não, acho que não. Mas elas saíram mesmo assim.
Eu respirei fundo algumas vezes e fechei os olhos. Quando os abri de novo, o Ricardo estava me olhando meio intrigado.
– O quê? – perguntei, tentando me conter e não deixar o coração bater rápido demais.
– Nada. – me respondeu, baixando os olhos de volta pro Game Boy.
– Claro… – murmurei, tentando não olhar pros olhos verdes concentrados, nem pras sobrancelhas claras franzidas, ou o cabelo brilhante e macio que eu tinha tanta vontade de tocar.
Um minuto depois, ele voltou o olhar pra mim de novo.
– É só que eu entendo porque elas vieram te encher. – o Ricardo disse, e foi a minha vez de ficar confusa.
– E seria…? – perguntei.
– Você está se comportando como se realmente houvesse alguma coisa a mais.
– Mas não há! – eu ri, de um jeito meio histérico; ele era a última pessoa que eu queria que pensasse isso – Não mesmo!
– É disso que eu estou falando! – e riu também – Você nega demais pra quem não tem nada a esconder. Se realmente não tem nada, você devia só deixar todo mundo falar.
– Eu não gosto que falem de mim.
– Eu sei.
E ficou quieto, me olhando. Eu sustentei o olhar, sem me intimidar.
– Mas tem alguma coisa, certo? – o Ricardo perguntou, por fim, com um meio sorriso que quase me matou do coração – Vocês não voltaram simplesmente a se falar assim, do nada. O Met é um cara durão. Qual é?
Eu abri a boca, mas não emiti som. Era melhor que ele soubesse logo que havia algum interesse – que não era meu!!! – em jogo, então ele veria que eu ainda estava lá, de um modo ou de outro, se é que me entendem. Então eu ri e, agradecendo pelo barulho na classe desocupada, respondi:
– Tem. Só que ele não sabe.
– E seria…? – insistiu, os olhinhos brilhando.
Como ele pode ser tão lindo?
– Eu me aproximei dele por causa das minhas primas que queriam conhecer ele. – contei.
– A Lana está na nossa sala, pra que elas precisariam de você? – quis saber, e eu tive que pensar numa justificativa rápida.
– Elas não conhecem a Lana e, bom, a Bela deu a entender que eu teria mais facilidade em lidar com ele nesse caso.
– Você não acha que ele está se aproximando de você por sua causa?
– Eu duvido que ele ainda tenha alguma coisa por mim. E, na boa, perto da Giovanna quem ia realmente querer saber de mim?
O Ricardo sorriu e pareceu que ia responder alguma coisa, mas então desistiu e voltou a jogar.
O sinal bateu e eu quis morrer.
Por que a gente não tem super-poderes, tipo telepatia, numa hora como essas? Eu faria qualquer coisa pra saber o que ele estava pensando!

[continua… dia 02/06]
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1 thought on “O Diário (nada) Secreto – Capítulo 2

  1. Lolita, eu não acho que você deveria ter contado para o RiRi 🙁 Eu até concordo que o Edson/Met pode ser um cara durão, como o RiRi falou, mas algo me diz que o RiRi não é um cara bem maravilhoso desde que o Edson tentou avisar a Lolita. Bom, vamos saber em breve 😉 Quero maaaaaais :B

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