O Diário (nada) Secreto – Capítulo 14

Conheça O Diário (nada) Secreto

Capítulo 1 – Recepção Calorosa


Capítulo 2 – Jogo de Interesses


Capítulo 3 – As sete coisas que não se deve fazer em uma festa


Capítulo 4 – A semana seguinte


Capítulo 5 – Cíúmes


Capítulo 6 – Proibido é mais gostoso


Capítulo 7 – Quem tem medo do lobo mau?


Capítulo 8 – Verdades e Declarações


Capítulo 9 – Junina


Capítulo 10 – Beach, Bitch!


Capítulo 11 – Dia dos Pais Mal Assombrado


Capítulo 12 – Letra e Música


Capítulo 13 – Não aprendi a dizer adeus

Capítulo 14 – Meus quinze anos
Setembro foi embora com uma velocidade estonteante.
Fosse porque eu estava extremamente feliz com o meu novo namorado – embora ele não tivesse me pedido nada -, fosse porque Bela estava se recuperando, tudo parecia estar perfeito. Não havia nada que eu quisesse mudar àquela altura: éramos de novo uma turma perfeita. Bela e suas piadinhas e seu senso de humor negro, Giovanna atirando pra todos os lados, Sabrina caidinha e de rolos com o tal de Kauê e todo mundo tão bem quanto poderia estar.
O que começou a me incomodar foi quando, no primeiro dia de outubro, a pergunta fatal chegou:
– E ai, animada pros seus quinze anos?
Foi Lana quem me questionou isso, numa tarde em que nós duas estávamos na casa dela, eu esperando enquanto o Edson tomava banho, ela fazendo a lição de química que eu iria copiar mais tarde. Eu suspirei, me lembrando do quão não-animada eu sempre ficava antes de todos os meus aniversários.
– Não vai ter nada demais. – afirmei, dando de ombros, tentando disfarçar o quanto isso me deixava frustrada. No fundo, eu queria uma festa. O primeiro, e provavelmente o último aniversário decente da minha vida depois de seqüências intermináveis de aniversários fracassados.
Mas fazer uma festa de quinze anos exigia um dinheiro que eu não tinha, o que significaria pedir ao meu pai. Coisa que eu não iria fazer. Se eu tivesse uma festa de quinze anos, de qualquer maneira, meu melhor presente seria que ele não aparecesse.
– Como assim, Lolita? – a Lana parou de escrever e me olhou, indignada – É o seu aniversário de quinze anos, você tem que comemorar de alguma maneira!
– Eu não sou muito fã de comemorar os meus aniversários. – respondi, mordendo o lábio – Sem querer ser pessimista ou dramática, mas sempre sai alguma coisa errada.
– Isso é besteira! Você no mínimo tinha que sair pra fazer alguma coisa.
– Eu prefiro ficar na minha até o dia 15 de outubro passar. Além do mais, é um feriado!
– Então você podia ir viajar!
– Sem sugestões. – determinei – E não fale nada sobre isso com o Edson!
Ela fez que sim e não disse mais nada.
Mas claro que o meu pedido não adiantou em nada. Eu até podia contar com a Lana pra não abrir a boca sobre o assunto, mas não podia confiar nele pra esquecer que o meu aniversário estava chegando. Mesmo na nossa época de melhores amigos, anos atrás, ele sempre me aporrinhava com o negócio sobre o meu aniversário.
Por isso, por mais esperanças que eu tivesse, eu não precisei esperar muito tempo além de nós estarmos na fila do cinema pra ele dizer a frase do mês:
– Então, seu aniversário está chegando, hein?
Eu bufei, e ele apertou minha bochecha.
– Ei, qual é? – brincou – Ta desanimada porque vai ficar velhinha?
– Mais ou menos. – respondi, beliscando a bochecha dele de volta. Só que mais forte, e por isso ele fez:
– Ai! – massageou a bochecha vermelha – Isso doeu!
– Era mesmo pra doer.
– Agora, falando sério. Vai querer o que no seu aniversário?
– Uma casa e um carro importado.
– Eu disse pra falarmos sério!
– Eu estou falando sério!
O Edson fez uma careta e me mostrou a língua como uma criança. Eu ri, e mostrei a língua pra ele também. Demos uns passos pra frente na fila pra comprar os ingressos, então ele passou um braço sobre os meus ombros.
– To falando sério, amor! – exclamou, e o jeito como ele me chamou de “amor” fez meu coração derreter como manteiga – Eu não quero que você fique pra baixo no seu aniversário. Me peça qualquer coisa ao alcance da minha carteira, e você terá!
Dei risada do seu tom profundo, e fiz que ia pensar enquanto ele comprava as nossas entradas. Íamos assistir um tal de “Abismo do Medo”. Eu não curtia muito filmes de terror, mas o Edson era fascinado. Concordei por pura falta de opção.
– Já sei o que eu quero! – eu disse, de repente, quando ele apareceu ao meu lado de novo.
– Você é rápida! – exclamou, fingindo estar impressionado – Não abuse da minha mesada, por favor!
– Quero ficar com você o dia todo. – respondi – Quero que você me faça uma surpresa.
Nem eu sabia de onde eu tinha tirado aquilo. Eu só precisava de uma resposta, e aquela era uma solução rápida que me parecia muito boa. Ele me deu uma risadinha diabólica.
– Boa pedida! – afirmou – Pode deixar comigo!
Decidi que não ia mais pensar no assunto enquanto entramos na sala de cinema.
Mas é claro que não adiantou.
Antes do dia dez, eu já estava a mil. Ninguém sabia de nada, e o Edson se recusava a dar uma única dica.
O que ele estaria aprontando? Só de imaginar, me davam calafrios.
E eu também não podia deixar de pensar que tudo ia dar errado, de alguma forma. Como em todos os aniversários – o carma da minha vida.
Mas eu tinha que tirar aquilo da cabeça. Esse ano, iria ser diferente. Não tinha que ser algo inevitável, essa coisa da má sorte. Nem tinha que ser má sorte. Não, dessa vez ia dar tudo certo.
Não ia?
Faltavam três dias pro meu aniversário, e também era um feriado. Além de ser Dia das Crianças, era o dia da padroeira do Brasil. Enquanto os fiéis de Nossa Senhora de Aparecida lotavam as igrejas, eu estava em casa, assistindo televisão e tomando sorvete com a minha mãe.
E, por mais incrível que pareça, ela não tinha me feito nem uma pergunta sobre o meu aniversário ainda.
Obviamente eu estava achando aquilo tudo muito estranho. Não era o comportamento normal dela, simplesmente ignorar que o meu aniversário seria dali a três dias e nem me perguntar se eu queria aquele livro que eu tinha visto de presente. Ela estava muda demais.
O que só podia significar uma coisa.
– Você sabe, né? – perguntei, de repente. Ela me olhou e deu outra colherada na mistureba de sorvete de flocos com calda de caramelo e pedaços de bolacha Negresco.
– Sei o quê? – perguntou, com a maior cara de cínica.
Era tão fácil saber quando a minha mãe mentia e/ou estava tentando disfarçar alguma coisa. Ela erguia as duas sobrancelhas pra olhar pra mim, e distraía mãos e boca com alguma coisa – no caso, o sorvete – pra não começar a rir. Os cantos da boca dela tremiam de vontade, e ela fazia uma cara de inocência tão forçada que era realmente difícil de acreditar.
– Você sabe! – exclamei, rindo, e batendo nela com uma almofada – Ah, meu Deus, como eu sou idiota, é claro que você sabe!
– Eu não sei do que você está falando. – minha mãe insistiu, virando-se novamente pra televisão e tomando mais um pouco de sorvete. As sobrancelhas ainda estavam erguidas.
– Ele te contou o que ele ta aprontando, né? – perguntei – O Edson?
– Talvez…
– Não seja cínica, mãe! Você nem me perguntou o que eu quero de presente até agora, é claro que você ta metida nessa!
– O que você quer de aniversário, aliás?
Joguei uma almofada que pegou em cheio na cabeça dela, e ela começou a rir. Às vezes, estar com a minha mãe era mais parecido com estar com uma adolescente do que quando eu estava com a Bela, por exemplo.
E ela ria tão descontroladamente de mim que eu comecei a rir também.
– Mãe, droga, é sério! – exclamei, parando aos poucos de rir – O que ele te contou?
– Ele me pediu ajuda. – ela respondeu, com um suspiro. Franzi a testa e torci o nariz.
– Ajuda pra quê?
– Pra surpresa que ele vai te fazer!
– Ah, meu Deus! O que é a surpresa pra ele precisar de ajuda?
– Eu não posso contar, Carlota, é uma surpresa!
– Eu não acredito que vai me deixar morrer na curiosidade!
– Claro que eu vou! Ele pediu segredo!
– Droga! – bufei e terminei de tomar meu sorvete. Me levantei e comecei a ir pra cozinha, mas parei no meio do caminho – Mãe?
– Eu! – disse, me olhando com a mesma cara cínica que me fazia querer dar risada.
– Você pode começar a me chamar de Lolita como presente de aniversário. – pedi, e ela riu.
– Tudo bem, mas só a partir do dia quinze.
Se eu sobrevivesse até lá.
Eu ainda estava tentando decifrar o mistério quando sentei na frente do computador. Eu não fazia isso com muita freqüência. O computador, quero dizer. Nossa internet era discada e um pesadelo de lentidão, mas hoje era feriado e, apesar da velocidade continuar não sendo das melhores, pelo menos o acesso era mais barato.
Abri a janela de conexão e fui arrumar meu quarto enquanto ele conectava, fazendo aquele barulho irritante. Caiu umas três vezes só as tentativas antes de conectar.
Que ótimo.
Enfim, conectou. Eu sabia que todo cuidado era pouco com aquela internet desastrosa, então, a primeira coisa que eu fiz foi abrir a página da internet. Verifiquei os meus e-mails e os da minha mãe. Então minimizei a tela e abri o MSN, pacientemente esperando ele entrar.
Então abriu, e, depois de alguns minutos esperando o computador fazer a gentileza de destravar, consegui abrir uma janela com a Bela, uma das poucas almas online naquele feriado.
Lo.Li.Ta diz:
Oi, Bela J
Bela Atriz (hehe) diz:
E ai?
Lo.Li.Ta diz:
Tudo bem por aqui. E ai?
Bela Atriz (hehe) diz:
Sei lá.
Lo.Li.Ta diz:
Nossa, acredita que o Edson ligou aqui pra casa pra pedir ajuda da minha mãe pra tal surpresa do meu aniversário? To morrendo pra saber o que é!
Bela Atriz (hehe) diz:
Lolita… agora não, ta?
Lo.Li.Ta diz:
?
Bela Atriz (hehe) diz:
To sem paciência pra esse tipo de assunto besta. Se você parasse de olhar pro próprio rabo, talvez soubesse.
Lo.Li.Ta diz:
Bela, de onde saiu isso?
Bela Atriz (hehe) diz:
Fala sério. Desde que você começou a namorar com o Edson, você simplesmente esqueceu da nossa amizade!
Lo.Li.Ta diz:
Você fez exatamente a mesma coisa enquanto tava com o William e eu não reclamei, Bela! As coisas mudam quando a gente namora!
Bela Atriz (hehe) diz:
Então o que, você ta fazendo de propósito?
Lo.Li.Ta diz:
Não seja ridícula, você sabe que não.
Bela Atriz (hehe) diz:
Eu sei? A única coisa que eu sei de você ultimamente é que você está namorando. A gente mal conversa.
Lo.Li.Ta diz:
Ok, me diz então, o que você quer que eu faça? Que eu peça desculpas por ser uma amiga ruim nos últimos tempos?
Bela Atriz (hehe) diz:
Não. Eu quero que você mude, droga! Que pare de esquecer que eu existo!
Lo.Li.Ta diz:
Isso parece conversa de namorado ciumento.
Bela Atriz (hehe) está offline.
Meu Deus, isso só pode ser brincadeira!
Ou isso, ou a Bela estava seriamente depressiva e descontando na minha pessoa.
Porque realmente parecia conversa de namorado ciumento. Só que ela com ciúmes do meu namoro era uma idéia completamente ridícula demais até pra ser considerada.
Quero dizer, a gente era amiga há uns cem anos. Nem mesmo com o Ricardo, minha paixão de anos, ela tinha sido um problema maior do que dizer que não ia dar certo. E agora isso?
Bom, talvez fosse apenas por causa de todo esse negócio do William ter ido embora. Ela devia mesmo estar se sentindo sozinha, e eu tinha começado a entrar de novo na aura de felicidade justamente no pior momento dela. Eu realmente não tinha sido a melhor das amigas desde isso tudo – me dividir entre ela e o Edson há quase um mês (fiquei feliz de me lembrar da data) deixava meu tempo muito limitado.
E, eu tinha que admitir, se eu tivesse que escolher entre passar uma hora beijando o Edson e uma hora tentando animar e conversar com a minha melhor amiga e depressiva Bela, eu nem ia pensar muito antes de escolher a primeira opção.
Era isso. Não era ciúmes. A Bela estava certa. Eu estava mesmo sendo uma amiga péssima.
Então ele surgiu e me chamou no MSN e eu esqueci disso por um bom tempo.
A Bela não falou comigo no dia seguinte.
Eu nem sabia direito como estava me sentindo. Eu era 50% raiva pelas coisas que ela tinha me dito, e 50% tristeza porque ela estava certa e graças a isso nós não estávamos nos falando.
E o fato de que o Edson não apareceu na escola não ajudou nada.
– Cadê o seu irmão? – perguntei pra Lana, na segunda aula. Como eu e a Bela não estávamos exatamente bem uma com a outra, saí do meu lugar de costume na frente dela e vim parar na segunda carteira do outro lado da sala, logo atrás da Lana e ao lado do Diego.
E era aula de inglês, então ela podia se dar ao luxo de virar pra trás e me dar uma resposta.
– Ele disse que tinha umas coisas pra fazer. – ela me respondeu, mas ainda com as costas viradas pra mim. Bufei.
– Você sabe, né? – me vi indagando, logo em seguida – Da surpresa?
– Sei.
– E não vai me contar?
– Por que eu faria isso? Meu irmão ta se esforçando muito pra que você não saiba!
Fiquei quieta. Numa coisa ela estava certa, ele estava se esforçando muito.
Porque ele completamente estava conseguindo!
– Nem uma diquinha? – fiz a última tentativa, olhando de relance pro Diego, com uma cara de cachorro pidão. Ele riu e ajeitou os óculos.
– Não olhe pra mim! – ele disse – Você sabe que eu sou o lado fraco pra segurar segredos!
– Lana! – insisti, e ela virou pra mim, balançando a cabeça.
– Nada feito. – afirmou – Pode sossegar, só faltam mais dois dias!
– Diego, pela nossa amizade! – apelei, e ele riu – Por favor, só uma coisinha mínima!
Ele fez uma careta, erguendo os óculos nas bochechas de um jeito hilário. A Lana olhou pra ele de um jeito meio “decida-se, eu não vou falar nada”. Forcei mais meu olhar de desespero.
– Digamos… – começou, e meu coração deu uma guinada – Que vai colocar a minha surpresa pra Lana no chinelo.
Assenti, fingindo que aquilo era o bastante.
Não era.
Só aumentava a minha curiosidade.
Porque, quero dizer, o que pode ser ainda maior, melhor e mais totalmente encantador do que uma serenata debaixo de chuva, levando os amigos para um poço de vergonha?
Ah. Meu. Deus.
Aqueles dois dias se passaram tão lentamente que mais pareceram cem anos.
Eu nunca tinha estado tão ansiosa pra um aniversário antes. Nunca tinha tido nenhum motivo pra ficar na expectativa, apenas com medo, porque eu sabia que alguma coisa ia dar errado.
Era a primeira vez que alguém estava ali, se esforçando pra que desse certo, pra que fosse inesquecível. Eu ainda não acreditava que tinha deixado o Edson me fazer uma surpresa. Eu era tão idiota. Eu já estava comendo os braços de curiosidade.
Mas agora só restava um dia até o temido – e, agora, desejado – dia 15 de outubro. Logo, a espera estaria acabada e eu ia sorrir e ficar feliz da vida com a surpresa linda que ele estava preparando.
Isso se a minha sorte não estragasse tudo e viesse um furacão que iria sugar todo o trabalho dele ou algo do tipo.
Deus me livre!
Pra piorar tudo, minha mãe estava me evitando pra que eu não fizesse perguntas cujas respostas ela não conseguiria segurar, e a Bela ainda não falava comigo. Eu nem conseguia pedir desculpas pelo meu comportamento, porque cada vez que eu chegava perto ela saia de cena. O que é uma droga quando você tem que admitir que está errada. Talvez eu devesse mandar o Edson segura-la e obriga-la a me ouvir falar.
Ou talvez eu devesse esperar as coisas se acalmarem e, do jeito como ela era bipolar de vez em quando, ela simplesmente ia voltar a falar comigo quando a necessidade fosse mais forte que o orgulho, e ela precisasse do único ombro amigo paciente que ela tinha. O que não deveria demorar muito, já que o humor dela estava tão péssimo que ela devia estar arranjando encrenca em todos os lugares onde pisava.
Preferi não pensar nisso, optando por me preocupar unicamente comigo e com o meu aniversário de quinze anos.
E com a surpresa que estava por vir.
Fui dormir naquela noite de quarta-feira com o coração martelando forte e a cabeça girando de curiosidade.
Quando eu acordei, estava sozinha em casa.
Minha mãe não atendia o telefone. Tampouco o Edson. Eu tinha o estranho e óbvio pressentimento de que os dois estavam juntos armando alguma coisa para o dia, ainda mais quando encontrei a nota, sobre a mesa da cozinha, escrita com a letra dele:
“Fique quietinha em casa. Eu te busco quando chegar a hora,” dizia.
Ótimo. Maravilhoso.
Foi um dia calado. O telefone não tocou nenhuma vez enquanto eu esperava e via as horas passarem, lentamente, ansiando e ameaçando comer os braços de tanto nervosismo.
A manhã se foi, e levou a tarde com ela. Eu estava fazendo furos no chão de tanto andar de um lado pro outro, telefone na mão, discando ou esperando alguém ligar.
Nada.
Meu Deus, eles tinham me esquecido ou o quê? Oiee, tem uma aniversariante desesperada aqui esperando, sabiam?
Eu estava pensando em gritar isso para o alto quando a porta da sala se abriu e eu me assustei. Eu ainda estava vestindo os meus pijamas, e estava refazendo o caminho do quarto para a sala com o telefone na mão pela terceira ou quarta vez nas últimas duas horas.
Era a minha mãe. Ela entrou e fechou a porta, e ficou me olhando com aquela cara de “você tem problemas?”
Mas eu não tinha problema nenhum, exceto aquela surpresa misteriosa sobre a qual ela sabia e não queria me contar.
Ah, sim. Eu citei que é meu aniversário e ninguém me ligou nem me deu parabéns? Contando minha própria mãe?
Obrigada, dona Abigail!
– O que você ta fazendo de pijama ainda, menina? – ela perguntou, ignorando o fato de que era meu aniversário, eu era sua única filha e nós não tínhamos nos falado nem nos visto o dia todo – Já são quase seis horas.
SEIS HORAS?
Que ótimo. Considerando que eu acordei às 10, eu estou sozinha há exatamente oito horas. Legal pro dia do nosso aniversário, né?
– Você estava com o Edson? – eu fui logo perguntando. Se ela podia ignorar as coisas, eu também podia.
– Estava. – mamãe me respondeu, passando por mim como ela faria em um dia qualquer – E você devia ficar pronta. Ele disse que ia passar pra te pegar às sete.
– Ah, muito obrigada por toda a consideração do aviso! – exclamei, ironicamente, girando os olhos. A verdade é que eu estava bem puta da vida com toda essa história de surpresa. Eu achava bom que fosse algo realmente grande, pra compensar tudo o que eu estava passando por causa disso!
Fui pro meu quarto e abri o guarda-roupa. Eu nem fazia idéia do que vestir, simplesmente porque não tinha idéia do que podia esperar. Bufei e peguei uma calça jeans e uma blusinha azul aberta nas costas. Era outubro, e estava até que bem quente. Então peguei minha toalha e fui tomar banho.
Eu era mais ou menos rápida pra me arrumar, mas o tempo que custou a passar durante todo aquele dia foi cruelmente veloz na minha última hora de espera. Quando eu vi, mal tinha começado a maquiagem e já eram cinco pras sete. Rezei pra que ele se atrasasse. E pra que desse tudo certo. Embora uma coisa não fizesse o menor sentido combinada à outra.
O interfone tocou quando eu estava quase acabando e já passava um pouco das sete. Minha mãe atendeu quando percebeu que eu não o faria e o deixou entrar. Então bateu na porta do meu quarto.
– Ele chegou. – disse, do outro lado.
Parecia animada.
Pelo visto, não animada demais pra me desejar um feliz aniversário.
Calcei minhas sandálias sem salto num pulo e corri pra porta no exato momento em que soou a campainha.
– Oi. – eu soltei, numa lufada de ar. Ele estava vestido exatamente como sempre, e me olhava com um sorriso do tipo “estou escondendo alguma coisa”.
– Pronta? – me perguntou. Eu assenti, sem dizer nada, e ele me estendeu a mão.
Peguei-a e saí, fechando a porta atrás de mim. Nenhum de nós falou nada, e eu achei melhor só deixar que ele me levasse pra onde quer que nós estivéssemos indo. Quando chegamos no piso térreo do meu prédio, ele parou e procurou uma coisa nos bolsos.
– O que foi? – acabei perguntando, confusa. Ele tirou um lenço enorme do bolso, do tipo que se usa na cabeça, e começou a tampar meus olhos.
– Faz parte da surpresa. – disse, apenas, e eu mascarei um bufar com uma risada sem humor.
– Que ótimo!
Ele pôs as duas mãos nos meus ombros e me empurrou de leve, me fazendo voltar a andar. Não pude evitar colocar as mãos pra frente, como uma múmia, tentando desnecessariamente me proteger de alguma coisa que pudesse me atingir, e em vão descobrir pra onde eu estava indo.
Só pude ouvir música. E sentir um ventinho gelado de começo de noite me atingindo, me deixando arrepiada. O Edson continuou me levando, me conduzindo Deus sabe pra onde. Mesmo de olhos vedados, eu sabia que tinha um pouco de luz onde quer que a gente estivesse. Abanei as mãos, mas não atingi nada que pudesse me ser útil.
Então ele parou e meu coração chacoalhou, a mil, dentro do meu peito.
Devagar demais, como se fosse em câmera lenta, ele desamarrou o lenço que cobria os meus olhos e o tirou. Meus olhos doeram a princípio, acostumando-se à nova claridade.
Olhei para os lados, meio zonza.
Estava todo mundo ali. Bem, não todo mundo, mas a maior parte. A Suellen, o Daniel, a Lana e o Diego, minha mãe, a Giovanna e a Sabrina, e até mesmo o Henry. Todos de branco.
Meu coração se apertou. A Bela não estava lá. A primeira lágrima escapou, e eu não sabia se era de tristeza ou de emoção.
Fiquei boquiaberta ao perceber que estávamos na área da piscina. Ela estava cheia de pétalas de flores, e havia velas iluminando toda a área ao redor.Tinha uma mesa de plástico com refrigerantes e algumas coisas pra comer.
Eu não sabia o que dizer. Só sentia as lágrimas escorrerem e o queixo cair, e uma risada louca me escapou quando todo mundo gritou ao mesmo tempo:
– SURPRESA!
Eu não conseguia nem dizer obrigada. Só sei que, de repente, estava uma fila e todo mundo estava me abraçando, me desejando felicidades, e eu não conseguia parar de chorar.
Quando o movimento acabou, me virei pro Edson e me atirei nos braços dele, dando um abraço forte que o fez balançar um pouco pra trás. Ele riu.
– Obrigada! – consegui choramingar no seu ouvido – Obrigada, obrigada, mil vezes obrigada!
– Ei, eu não fiz nada disso pra te ver chorando, certo? – me deu um beijo, e eu ri.
– Eu estou tão feliz! – rir e chorar ao mesmo tempo me fez soluçar um pouco, e eu funguei – Essa foi a coisa mais linda que alguém já fez pra mim!
Ele ia responder, quando a Giovanna gritou, perto da mesa de comida:
– E a valsa? Quinze anos tem que ter valsa!
Eu e ele nos olhamos e começamos a rir enquanto ela colocava uma música no rádio. Era lenta, mas não era valsa. Ele passou uma mão pela minha cintura, e pegou minha mão com a sua livre.
– Acho que é só um passo pra um lado e outro pro outro, certo? – brincou, e eu assenti.
– Como você fez tudo isso? – perguntei, maravilhada, ele deu de ombros.
– Tive a ajuda da sua mãe, e só precisei concordar em limpar tudo depois. – o Edson sorriu – Valeu a pena.
– Esse é o melhor aniversário da minha vida!
– Eu vou fazer com que todos sejam os melhores da sua vida.
– Eu te amo.
– Também te amo.

A minha felicidade ultrapassava todos os limites naquele momento.

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