A bomba

Um aluno certa vez me disse para “comprar um coração”. Um amigo me disse que as vezes eu não pareço ter sentimentos. Meu chefe uma vez se espantou ao me ver chorando e disse que “não sabia que eu era tão emotiva”.
Sempre estranho quando pessoas aleatórias tem essa visão tão seca de mim, porque sempre me considerei meio manteiga derretida. Houve um tempo em que eu não segurava nada pra mim – se sentisse, botava pra fora, fosse em lágrimas ou rompantes de raiva. Mas tenho que admitir que fui me guardando mais ao logo dos anos. Não sei por que.
Às vezes eu acho que, conforme fui envelhecendo, fui tendo para mim que ser uma pessoa emotiva e aberta quanto às minhas emoções era algo errado – tinha essa visão de que uma mulher adulta não podia ser tão chorona, nem tão propensa a barracos, nem tão aberta. Me fechei porque achei que estava demonstrando demais, sentindo demais, até, e gente grande não sente. Gente grande guarda.
Bom, olha aí a novidade: gente grande sente, e sente muito. E cada vez que guardo o que sinto, é como se estivesse adicionando elementos químicos a uma bomba em potencial. Vivo pisando em ovos com meus próprios sentimentos porque sei que, a hora que essa bomba cair, ela vai explodir – e arrastar tudo junto. Em vez de sentir aos pouquinhos, eu acumulo pra sentir tudo de uma vez só. 
E… Pra que?
Não me faz bem. Não me torna mais forte. Não me faz mais adulta, nem menos sentimental. Passa aquela falsa imagem de força, se inabalável, de indiferença, quando na verdade estou morrendo por dentro, cada dia com um buraco maior, uma lágrima a mais que não rolou, um desabafo que não fiz. É como se eu prendesse a respiração até o limite de explodir, e depois quisesse sentir todo o ar do mundo de uma vez. Não tem necessidade. Sentimentos , assim como ar, são necessários.
Preciso reaprender a sentir. Melhor, preciso reaprender a não ter medo de sentir. Preciso me lembrar de como era não tentar manter tudo trancado, como era só sentir e ser e deixar sair. Era tão mais fácil, tão mais limpo. Talvez assim eu não sentisse que estou prestes a explodir.

1 thought on “A bomba

  1. Depois qur eu perdi uma amozade por conta de guardar as cosias e não falar na hora o que estava me incomodando, passei a expressar mais meus sentimentos. Tanto os bons quantos os nem tão cristãos assim…
    Envelhecer tem dessas coisas…

    Adorei seu texto, o primeiro que leio.
    Bjs

Leave a Reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *