Mar aberto

Ela sempre dava tudo de si. Para ela, relações eram como um enorme mar de possibilidades. Não havia meio termo — eu entra de cabeça, de uma vez, ou simplesmente não entra.

Por não saber como ser menos, ela sempre era mais: mais carinhosa, mais aberta, mais receptiva, mais confiável. Fazia tudo por quem amava, porque seu amor não conhece limites. Doava-se. Das cartas de amor aos muitos favores, dos pequenos esforços aos grandes gestos, dificilmente dizia não.

Então um dia algo começou a incomodá-la. Olhou para seu breve mar e percebeu que tudo aquilo que ela entregava, as ondas não traziam de volta. Não haviam cartas em resposta, nem grandes gestos, nem pequenos favores. Percebeu que, enquanto ela dava tudo que tinha, os outros às vezes a retribuíam com migalhas; às vezes com nada. Enfureceu-se: decidiu que não seria mais a nadadora fiel que dá de toda sua energia a cada braçada, e se tornaria mar, como os outros, tomando o que lhe dessem sem se preocupar em retribuir mais que uma maré boa quando assim lhe conviesse.

Mas não durou muito, percebeu que não sabia viver assim. Quem é copo cheio não consegue se contentar em ser copo vazio. Aquele tudo que ela costumava entregar a todos fazia falta principalmente a ela, pois que graça tem uma relação em que nada se cede, nada se doa?

Por não conseguir mais ser menos, tornou-se mais novamente. Escreveu suas cartas. Prestou os favores. Fez suas grandes declarações. Foi fiel a si mesma. Entendeu que não se atirava de braços abertos ao mar porque esperava que o mar fosse igualmente bondoso com ela; não há como cobrar reciprocidade do imprevisto. Talvez nadasse eternamente, talvez se afogasse, talvez voltasse à costa. Descobriu que o mais importante era mesmo isso: jogar-se ao mar. Entregar-se. Sem esperar nada em troca.

Texto inspirado na sugestão da @jacdeoliveira no Twitter 

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